Imunidade parlamentar e medida cautelar
O Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente ação direta de inconstitucionalidade na qual se pedia interpretação conforme à Constituição para que a aplicação das medidas cautelares, quando impostas a parlamentares, fossem submetidas à deliberação da respectiva Casa Legislativa em 24 horas.
Primeiramente, a Corte assentou que o Poder Judiciário dispõe de competência para impor, por autoridade própria, as medidas cautelares a que se refere o artigo 319 (1) do Código de Processo Penal (CPP). Vencido, nesse ponto, o ministro Marco Aurélio que julgou ser inaplicável a referida norma legal.
Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, também por votação majoritária, deliberou encaminhar, para os fins a que se refere art. 53, §2º (2), da Constituição Federal (CF), a decisão que houver aplicado medida cautelar sempre que a execução desta impossibilitar direta ou indiretamente o exercício regular do mandato legislativo.
Salientou que, na independência harmônica que rege o princípio da separação dos Poderes, as imunidades parlamentares, assim como a vitaliciedade na magistratura, a irredutibilidade de vencimentos e a inamovibilidade, na independência harmoniosa que rege o princípio da separação de Poderes, são instrumentos de vital importância, visto buscarem, prioritariamente, a proteção dos parlamentares no exercício de suas funções, contra os abusos e pressões dos demais Poderes. Constitui-se, pois, um direito instrumental de garantia de liberdade de opiniões, palavras e votos dos membros do Poder Legislativo bem como de sua proteção contra prisões arbitrárias e processos temerários.
O Plenário asseverou que essas imunidades não dizem respeito à figura do parlamentar em si, mas à função por ele exercida, ao Poder que ele representa, no intuito de resguardar a atuação do Legislativo perante o Executivo e perante o Judiciário, consagrando-se como garantia de independência perante os outros dois Poderes constitucionais.
Afirmou que, no tocante à imunidade parlamentar processual em relação à prisão, a “ratio” da norma constitucional é somente permitir o afastamento do parlamentar do exercício de seu mandato conferido pelo povo em uma única hipótese: prisão em flagrante delito por crime inafiançável. O art. 53, §2º, da CF protege o integral exercício do mandato parlamentar, ao referir, expressamente, que a restrição à liberdade de ir e vir do parlamentar somente poderá ocorrer na referida hipótese. Dessa forma, a norma constitucional estabeleceu, implicitamente, a impossibilidade de qualquer outro tipo de prisão cautelar.
Nesse contexto, a Corte ponderou que, sendo a finalidade da imunidade formal proteger o livre exercício do mandato parlamentar contra interferências externas, a “ratio” da norma constitucional não pode ser contornada pela via das medidas cautelares diversas da prisão.
Assim, ato emanado do Poder Judiciário que houver aplicado medida cautelar que impossibilite direta ou indiretamente o exercício regular do mandato legislativo, deve ser submetido ao controle político da Casa Legislativa respectiva, nos termos do art. 53, § 2º, da CF.
Vencidos os ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber e Celso de Mello, que julgaram improcedente o pedido. Entenderam que os poderes conferidos ao Congresso para sustar processos penais em curso são estritos, circunscritos às hipóteses especificamente limitadas na CF, pois as medidas cautelares penais não são instrumentais apenas ao processo penal, mas também meios de tutela da fase pré-processual investigativa e da ordem pública.
Nesse sentido, a outorga constitucional de poder para sustar um processo penal não compreende a concessão de poderes para impedir a adoção de providências cautelares necessárias à tutela da ordem pública (visando a impedir reiteração delitiva), bem como, à tutela da investigação e completa elucidação dos fatos.
(1) CPP: “Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX - monitoração eletrônica”.
(2) CF: ”Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. (...) § 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão”.
ADI 5526/DF, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 11.10.2017. (ADI-5526)
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Decisão publicada no Informativo 881 do STF - 2017
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